quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Um dia para Todos os Santos

Hoje, precisamente, é dia 31 de outubro. O mundo vêm conhecendo este dia como o famoso Dia das Bruxas, ou Halloween, festejado na América do Norte e amplamente divulgado pelo mundo. Junto disso, aparecem as famosas correntes de internet "contra" este dia. No caso específico do Brasil, muitas pessoas criticam o nosso modo de vida que busca muito da cultura norte-americana e divulgam o Dia do Saci (o "Haloween brasleiro"). Vamos fazer algumas considerações.

O que é o Dia do Saci? Muitos leigos não sabem a origem deste dia. Implantado por meio de uma lei federal pelo deputado Chico Alencar (PSOL - RJ) no ano de 2003, ficaria decidido que no dia 31 de outubro seria comemorado o Dia do Saci, um dia reservado à comemoração do folclore nacional, combatendo diretamente as festividades do Dia das Bruxas em molde norte-americano. Alguns estados nacionais, como São Paulo, oficializaram a data a partir deste ano, o que fez com que a divulgação fosse amplamente feita pelos meios sociais e informativos.

Mas qual o motivo de uma data como esta ser feita em contraposição á uma comemoração não-nativa brasileira? O significado do Halloween é realmente tão forte a ponto disso? Vejamos. O Allhallow-even é nada mais, nada menos, do que a véspera do Dia de Todos os Santos, na cultura celta. Porém, tem-se registros de comemoração cívica apenas a partir de 1745, nas regiões do Reino Unido, Estados Unidos e Canadá. Estes dois últimos, locais que sofreram a colonização inglesa, portanto, tendo contato direto com a cultura celta, típica das ilhas britânicas. Muito mais do que uma "festa à fantasia", é um dia dedicado á presença dos espíritos e mortos na terra, uma vez que não é possível a passagem de tais entidades para o plano mortal nas outras épocas do ano. Portando, a origem pagã tem a ver com a celebração celta chamada Samhain, que tinha como objetivo dar culto aos mortos. A invasão das Ilhas Britânicas pelos Romanos, em meados do século V, acabou mesclando a cultura latina com a celta, sendo que esta última acabou quase que desaparecendo ao longo dos anos e séculos.

Com efeito, observamos ainda assim a presença do Dia de Todos os Santos, hoje celebrado no dia 1º de novembro. Se buscarmos a origem católica desta data, conseguimos localizar, há mais de 1300 anos atrás, o papa Bonifácio IV, que estipulou as festividades dedicadas á todos os santos existentes, no dia 13 de maio (Festum omnium sanctorum) e realocada no calendário para o dia 1º de novembro, pelo papa Gregório III. No ano de 840, seu sucessor, Gregório IV, ordenou que este dia fosse celebrado universalmente, como temos conhecimento nos dias de hoje. Com um costume latino-cristão, a celebração do dia 31 de outubro era feita como "vigília" de todos os santos, e o dia 2 de novembro, como o dia dos finados, ou os que já faleceram e se foram deste plano para o Paraíso.

Este humilde historiador, então, vê da seguinte forma o Dia do Saci e manifestações de pessoas em sua apologia: esta data se apresenta mais como uma forma xenófoba e de negação de uma festividade mundialmente conhecida e celebrada, visto que tem origens cristãs e não apenas pagãs e como uma forma mesquinha e fraca de exaltação da cultura brasileira. Isso leva á outra discussão muito ampla, sobre a laicidade do estado brasileiro. Mas, no fim, como não reconhecer o Brasil como um país cristão, com a celebração nacional e paralização de serviços nas datas como Carnaval, Páscoa e Natal? Mesmo configurado como uma celebração unicamente pagã, a Vigília de Todos os Santos também tem sua parte cristã, que reclamem ou não, é presente na cultura brasileira. Qual a falta de legitimidade em comemora-lá? Quem sabe um dia fazemos a coisa certa, e ao invés de transformar uma data tão conhecida mundialmente, não investimos mais em cinema, música e artes nacionais?

por Fernando Tetsuo Miyahira.

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Morre Eric Hobsbawm, aos 95 anos.

Hoje, logo ao acordar, tive a triste notícia da morte do grande Eric Hobsbawm, considerado o maior historiador vivo da atualidade. Realmente, uma notícia muito triste, pois, sendo historiador de formação, estudei muito dele e principalmente de suas obras durante a graduação (e até fora dela). Por isso, não pude deixar de prestar a minha humilde homenagem ao homem que prestou um serviço tão grande para a humanidade: o estudo da História. Notícia de Carta Capital:

"O historiador marxista britânico Eric Hobsbawm, considerado um dos pensadores imprescindíveis do século passado, morreu nesta segunda-feira 1º aos 95 anos. Dono de uma vasta obra, Hobsbawm tem como livro mais famoso a Era dos Extremos(1994), no qual narra sua perspectiva sobre o que chama de “breve século XX”, o período iniciado com o começo da Primeira Guerra Mundial, em 1914, até o colapso da União Soviética, em 1991. O livro foi traduzido para quase 40 línguas e recebeu muitos prêmios internacionais.
“Ele morreu de pneumonia nas primeiras horas da manhã em Londres”, afirmou a filha do historiador, Julia Hobsbawm. “Ele fará falta não apenas para sua esposa, Marlene, e seus três filhos, sete netos e um bisneto, mas também por seus milhares de leitores e estudantes ao redor do mundo”, completou.
Hobsbawm, que influenciou gerações de historiadores e políticos, é reconhecido também por sua história do “longo século XIX”, que para ele se deu entre o início da Revolução Francesa (1789) e o início da Primeira Guerra Mundial (1914). A história do “longo século XIX” foi publicada em três volumes – A Era da Revolução: Europa 1789-1848, A Era do Capital: 1848-1875 e Era do Império – 1848-1914.

Biografia

Nascido em 9 de junho de 1917 em uma família judaica de Alexandria, Egito, Hobsbawm foi criado em Viena no período entre as duas grandes guerras mundiais, antes de seguir para Berlim em 1931. Ele se mudou para Londres dois anos depois, quando os nazistas chegaram ao poder.
Depois de estudar História e obter o Doutorado na Universidade de Cambridge, Hobsbawm se tornou professor em 1947 no Birkbeck College de Londres, centro ao qual seguiu ligado por toda a carreira. Também foi professor convidado na Universidade de Stanford, no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e na Universidade de Cornel."

Descanse em paz, herói.

por Fernando Tetsuo.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Um conservador católico em uma comunidade islâmica

Apesar de todo alvorosso nos países árabes nos últimos tempos, principalmente após a "Primavera Árabe", a Igreja Católica dá mais uma demonstração de sua necessidade em se atualizar, mostrando uma face menos conservadora. Eis a notícia:

"Beirute - O Papa Bento XVI, que chegou nesta sexta-feira a Beirute para sua primeira visita ao Líbano, rejeitou o fundamentalismo e estimulou a tolerância em uma região afetada pelo violento conflito na Síria, a emergência do islamismo e distúrbios em países árabes.

Esta visita, a segunda de Bento XVI no Oriente Médio - após uma viagem à Terra Santa em 2009 - é uma das viagens mais delicadas do Pontífice, de 85 anos. O Papa desembarcou sorridente e emocionado às 13H40 locais (7H40 de Brasília) no aeroporto internacional de Beirute, onde foi recebido por várias autoridades, incluindo o presidente da República, Michel Suleiman - único cristão chefe de Estado de um país árabe.

Em um contexto de incessante violência na Síria, Bento XVI pediu o fim da entrega de armas a este país, vizinho do Líbano, onde os confrontos entre o exército e os rebeldes provocaram mais de 27.000 mortes, em sua maioria civis. "As importações de armas devem cessar de uma vez por todas. Sem as importações, a guerra não poderia continuar", declarou ainda no avião aos jornalistas. "Ao invés de importar armas, o que é um grave pecado, seria conveniente importar ideias de paz, de criatividade, de amor ao próximo".

Dois dias depois de um ataque na Líbia que matou o embaixador dos Estados Unidos, e com uma série de manifestações no mundo árabe contra um filme americano ofensivo ao islã, Bento XVI se elevou contra o fundamentalismo. "O fundamentalismo é uma falsificação da religião, já que a tarefa da igreja e das religiões é purificar-se", declarou durante o voo."

(retirado de http://www.afp.com/en/home - France Presse)

Conhecido pelo radical conservadorismo, Joseph Ratzinger, o Papa Bento XVI impressiona com discurso antifundamentalista e um tanto mais liberal. O que mais impressiona é o fato de visitar um país com grande maioria muçulmana para realizar o discurso, e sendo aplaudido e ganhando "pontos" com a comunidade islâmica. A estrutura arcaica e ultrapassada de pensamento da Igreja Católica demonstra mais uma vez sua fragilidade, e também a necessidade de se atualizar em tempos onde a liberdade religiosa pede socorro.

por Fernando Tetsuo.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

A presença pentecostal na mídia brasileira


 O texto a seguir foi apresentado por Beatriz Carunchio e Fernando Tetsuo Miyahira como exame final das aulas de "História das Religiões" do curso de Mestrado em Ciências da Religião da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC - SP).

Neste breve texto, analisaremos um pouco a questão dos fiéis pentecostais e sua relação com a mídia, principalmente o rádio, meio de comunicação preferido dos fiéis pentecostais de “primeira” e “segunda” onda.     
Maria Lúcia Montes (MONTES, 2006) discute qual o espaço para a religião no Brasil durante o século XX, citando a presença crescente de pentecostais em relação aos católicos, uma vez que o Brasil pode ser encarado como “um país católico”. Segundo a autora, o crescimento dos evangélicos, que lhes deu visibilidade pública, se refletiu também no interior do próprio grupo, que desde a década de 80 procura, agressivamente, marcar sua presença na cena pública, principalmente valendo-se da força política após conseguirem a eleição de uma “bancada evangélica” no congresso nacional durante a mesma época. Mas, apenas isso faria com que o crescimento vertiginoso dos pentecostais crescesse no Brasil do século XX?
O que conseguimos identificar com a leitura do texto de Maria Lúcia Montes é a convergência dos pentecostais com a questão da mídia no Brasil, ou seja, os pentecostais, durante sua história no Brasil, utilizaram-se muito dos meios de comunicação em massa, principalmente o rádio quando falamos de pentecostalismo de “primeira” e “segunda” ondas. Aqui, nos preocuparemos em traçar um histórico do grupo dos pentecostais no Brasil, e a importância da mídia como meio de comunicação em massa enquanto instrumento que viabilizou o crescimento desse grupo religioso.
  
           Chegada e presença dos pentecostais no Brasil

Aqui temos a teoria das três ondas de Paul Freston, explicando o desenvolvimento histórico do pentecostalismo no Brasil. Segundo Freston, em “Evangelical Christianity And Democracy In Latin America” [1] a primeira onda pentecostal começou em meados do ano de 1910, com a chegada de missionários que mais tarde fundariam a Congregação Cristã (CC) e a Assembléia de Deus (AD), esta última em 1911. Tanto a CC como a AD nasceram de grupos influenciados pelo movimento pentecostal dos Estados Unidos, e acabam por desenvolver uma relação de proximidade com as igrejas protestantes norte-americanas e suecas. A CC teve muito sucesso junto aos imigrantes italianos em São Paulo, principalmente por tratar-se de uma prática que foi trazida por um artesão, também italiano e vindo dos Estados Unidos, de nome Luigi Francescon. Já a AD foi fundada em Belém, no estado do Pará por dois missionários norte-americanos, Gunnar Vingren e Daniel Berg, expandindo-se para todo o Norte e Nordeste do país, e depois para todo o território nacional, auxiliada pela grande repercussão entre as pessoas de mais baixa renda e também pelo fenômeno de urbanização no Brasil a partir do século XX. A Assembléia de Deus acaba de tornando a maior igreja pentecostal (e protestante) do Brasil, com mais de 7 milhões de fiéis. Tanto a CC quanto a AD contam com um rigoroso seguimento da fé, moral e costumes. Outra característica destas igrejas pentecostais é o não uso de meios de comunicação ditos modernos, como a televisão, rádio e Internet, pois pregam que os contatos pessoais (tanto como missão quanto nos cultos dos templos) são os únicos e verdadeiros meios de comunicação aprovados por Deus.
A segunda onda pentecostal trata-se do crescimento do movimento pentecostal de primeira onda nos anos 50 e início dos 60, correspondendo também com uma alta atividade missionária norte-americana no Brasil. De todas as igrejas surgidas nesta época, destacam-se três: a Igreja do Evangelho Quadrangular surgida em 1951, a Brasil para Cristo, de 1955 e a Deus é Amor, de 1962. Suas características em comum é o fato de terem sido iniciadas no estado de São Paulo, tal como se caracterizar por movimentos semelhantes á Renovação Carismática Católica e por enfatizarem muito questão da “cura divina”, ou seja, a cura de doenças graves como câncer, AIDS, etc, através da fé e da oração do pastor junto dos fiéis. Além de sua mensagem dirigir-se quase que unicamente à população muito pobre e desamparada, é mais liberal em termos de meios de comunicação do que as igrejas pentecostais de primeira onda, admitindo a comunicação via rádio e folhetins distribuídos nas próprias igrejas.
Finalmente, as igrejas pentecostais de terceira onda são denominadas também, por Freston, de “neopentecostais”, pois não apresentam ligação nenhuma com as matrizes protestantes que direcionaram as ondas anteriores. Características dos anos 70, as suas representantes mais fortes são a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), de 1977, a Igreja Internacional da Graça de Deus de 1980, e a mais recente, a Igreja Mundial do Poder de Deus, de 1998. As duas últimas surgidas depois de um desmembramento da Igreja Universal do Reino de Deus. Tais igrejas se caracterizam pela adaptação do quadro sócio-cultural brasileiro da década de 70, como o inchamento urbano, desenraizamento cultural e estagnação econômica, por isso uma de suas marcas é a chamada Teologia da Prosperidade, que consiste em um movimento surgido nas primeiras décadas do século XX nos EUA, consistindo em uma doutrina que afirma, a partir da interpretação de alguns textos bíblicos como Gênesis 17.7, Marcos 11.23-24 e Lucas 11.9-10, que os que são verdadeiramente fiéis a Deus devem desfrutar de uma excelente situação principalmente na área financeira e na área da saúde.

A mídia no Brasil 

Existem diversas definições para o termo mídia. Dias (2006) afirma que mídia veio do latim media, que quer dizer “meios”. Para o autor, este é um conceito não apenas ligado aos meios de comunicação de massa, mas também intimamente relacionado à publicidade, o que nos leva a questionar se, com isso, o conceito de mídia também não estaria ligado às ideologias que são veiculadas nos meios de comunicação, seja através da publicidade, seja através dos ídolos que promove. Duarte, Leite e Migliora (2006) definem mídia como a institucionalização do processo no qual diferentes agentes reunidos entram em confronto para chegar a uma síntese de significados, normalmente provisória. Já Coimbra (2001) sugere que a mídia é o principal instrumento de produção de significados e de formas de interpretar o mundo. Assim, não mostra apenas o que pensar, sentir e como agir, mas nos mostra sobre o que devemos pensar, sentir e agir. Isso nos leva a pensar que os ídolos e/ou ideologias que a mídia veicula de fato contribuem para o sentido que a pessoa dá a sua própria vida.
Outra informação essencial antes de prosseguir nesta discussão é que, segundo Thompson (2005), ao serem veiculadas pela mídia, as formas simbólicas passam por uma valorização econômica, ou seja, recebem um preço, um valor pelo qual são compradas ou vendidas. Deste modo, continua o autor, tornam-se bens simbólicos. Ou seja, pessoas/ídolos, informações, cultos religiosos e tudo o que a mídia veicula, torna-se uma mercadoria.
No nosso país, notamos que há uma grande ênfase na mídia eletrônica em detrimento das demais, tanto entre a população quanto nos meios acadêmicos, nos quais constatamos haver uma grande oferta de artigos e trabalhos principalmente sobre a televisão. Para Duarte, Leite e Migliora (2006), isso ocorre porque no Brasil, a grande maioria da população não se modernizou com informações de livros, e sim do rádio e da televisão. Com isso, a televisão é muito associada à inteligência (e inteligência é, para muitos, o mesmo que ter muita informação, mesmo que nem sempre essas informações sejam utilizadas na formação de um pensamento crítico).
Coimbra (2001), Mota (2004) e Dias (2006) ressaltam que a televisão se desenvolveu mais no Brasil no período da ditadura militar. Coimbra (2001) afirma que as telecomunicações eram associadas pelos militares ao desenvolvimento, modernização e segurança nacional. Por isso, afirma Mota (2004), foram instaladas redes nacionais, com a construção de estações repetidoras e a instalação de satélites. Para a autora, as redes nacionais integraram o país e facilitaram o controle da comunicação por parte dos militares.
Dias (2006) afirma que, ainda durante a ditadura militar, foi criado o Ministério das Telecomunicações, assim como políticas para o financiamento de televisores. Com isso, os militares pretendiam garantir o acesso da maior parte possível da população ao “milagre brasileiro da economia”, à Copa de 1970 e à transmissão ao vivo do carnaval do Rio. O autor comenta que, em menor proporção, esta foi a mesma estratégia utilizada pelo Ministro da Propaganda e da Informação da Alemanha nazista.

 Considerações Finais

Como mencionamos, ao veicular bens simbólicos, a mídia os transforma em produtos. Paralelo a isso, é popular no Brasil o pensamento de que aquilo que está na mídia é “bom” e “verdadeiro”. Essa idéia faz com que as informações veiculadas tendam a ser aceitas mais facilmente pela população. Assim, os “produtos” oferecidos pela mídia serão valorizados e consumidos, sem que haja maiores críticas por parte da grande maioria das pessoas.
Ao pensar o crescimento do pentecostalismo no Brasil, não podemos deixar de pensar no papel que a mídia teve ao transformá-lo em produto, ou melhor, em um bem de consumo.
Entretanto, devemos sempre ter em mente que, no caso de crenças religiosas, tal como em toda ideologia que se serve à interpretação da realidade, existe uma dimensão simbólica desse bem de consumo. Quem o consome, não “adquire” apenas uma religião e o status que ela traz, mas também “compra” imunidade contra o que Maria Lucia Montes chama no artigo estudado de “situações limite”, mas que os fiéis identificam apenas como “o Mal”: seja o Mal simbólico, representado na figura do demônio, seja o mal da vida cotidiana (doenças físicas e mentais, alcoolismo e dependência química, desemprego, miséria, problemas familiares, etc.). Concluindo, o que se compra não é apenas uma religião e uma forma de interpretar o mundo, mas sim um projeto político: a idéia de que uma vida melhor é possível, com saúde, trabalho e dignidade.  Compram a certeza de que se é merecedor de uma vida digna (aqui e agora), a chance de ser visto como ser humano.

  
BIBLIOGRAFIA
COIMBRA, C. M. B. “Mídia e produção de modos de existência”. Psicologia: teoria e pesquisa. Vol. 17, no 1, p. 01-04. Jan-Abr 2001.

CORTEN, André. “Pentecostalism In Brazil: Emotion Of The Poor And Theological Romanticism”. Palgrave, EUA: 1999.

DIAS, J. V. “Comunicação subliminar na mídia: propaganda televisiva na perspectiva da ética e cidadania”. 2006, 135 p. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social). Universidade São Marcos, São Paulo.

DUARTE, R.; LEITE,  C. e MIGLIORA, R. “Crianças e televisão: o que elas pensam sobre o que aprendem com a tevê”. Revista Brasileira de Educação. Vol. 11, no 33, p. 497-510, set./dez. 2006.

FRESTON, Paul. “Evangelical Christianity And Democracy In Latin America” EUA: Oxford University Press, 2008.

MENDONÇA, Antonio Gouvêa. “O protestantismo no Brasil e suas Encruzilhadas”, in Revista USP, n. 67, São Paulo: 2005.

MONTES, Maria Lúcia. “As figuras do sagrado: entre público e privado” in NOVAES, Fernando A. História da Vida Privada no Brasil vol. 4. SP: Companhia das Letras: 2006.

MOREIRA, Alberto. “Neopentecostalismo e Mercado de Trabalho”. SP: EDUSF, 1996.

MOTA, R. “Uma pauta pública para uma nova televisão brasileira”. Revista de sociologia e política. No 22, p. 77-86, jun 2004.

NOVAES, Regina Reyes. “Pentecostalismo, política, mídia e favela”, in VALLA, Victor Vincente, Religião e Cultura popular, Rio de Janeiro: DP&A, 2001.

THOMPSON, J. B. “A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia”. 7 ed. Petrópolis: Vozes, 2005.




[1] A idéia das Três Ondas do Pentecostalismo está contida em FRESTON, Paul. “Evangelical Christianity And Democracy In Latin America”.
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por Beatriz Carunchio e Fernando Tetsuo Miyahira

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Vaticano apoia Federico Franco, novo presidente do Paraguai

De acordo com o site do jornal Tiempo Argentino, a Igreja foi a primeira instituição religiosa a reconhecer o impeachment ocorrido no Paraguai neste último mês. Segundo as notícias, o núncio apostólico no Paraguai, Eliseo Arrioti, reuniu-se com o presidente Federico Franco e anunciou que o Vaticano seria o primeiro estado a reconhecer sua posse.

"El nuncio apostólico del Vaticano en Paraguay, Eliseo Ariotti, se reunió con Federico Franco, con lo cual el Vaticano se convirtió en el primer Estado en reconocer al nuevo presidente paraguayo y en admitir el golpe contra el ex obispo Fernando Lugo.

Ariotti fue uno de los primeros en ser recibido por el nuevo jefe de Estado, quien sólo podía atesorar en su favor un reconocimiento formal de Alemania –que no ve una interrupción constitucional en el jucio político express contra el mandatario constitucional– y de Estados Unidos, que se limitó por ahora a pedir “calma” a la sociedad paraguaya.

Luego de la audiencia con Franco, el representante del Papa Benedicto XVI manifestó su intención de “honrar a las autoridades” y pidió paz para el país, tras lo cual acotó que el Santo Padre envió un mensaje al país.

El prelado evitó dar a conocer detalles de la conversación mantenida con Franco. “Fue una conversación muy personal”, expresó a su salida del Palacio de Gobierno.
Ariotti señaló que “la paz es un don de Dios y sobre todo un don de los hombres”, y se mostró cauto en torno al reconocimiento oficial de los países hacia la nueva administración del Ejecutivo paraguayo.

A su turno, el ministro alemán de Cooperación Económica y Desarrollo, Dirk Niebel, declaró en Asunción que “no existen señales de que el cambio de gobierno haya sido inconstitucional”, tras reunirse en el Palacio de Gobierno con Franco. Pero al mismo tiempo advirtió que “el resultado de las votaciones en el Congreso que llevaron a la destitución del presidente Fernando Lugo son un mensaje político claro”.
Mientras tanto, Darla Jordan, portavoz del Departamento de Estado, instó a que los paraguayos 'actúen de forma pacífica, con calma y responsabilidad, conforme al espíritu de los principios democráticos' ".

As fontes são do blog de notícias Atrio (http://www.atrio.org) e do site do jornal argentino Tiempo Argentino (http://tiempo.infonews.com/).

Por Fernando Tetsuo.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

"O Nascimento das Religiões" - Parte II

Dissemos no post anterior, segundo Yves Laurant, sobre seu trabalho extensivo de pesquisa sobre o nascimento da religiosidade e sentimento religioso. Ainda sob a perspectiva de Laurant, a origem da religiosidade se encontra nas religiões xamânicas da sibéria, mais precisamente do povo Evenque.

Dada essa discussão inicial, no capítulo posterior Laurant disserta sobre a evolução do xamanismo na História, durante e pós a Revolução Neolítica, momento onde muitos povos deixaram seu estilo de vida nômade para se sedentarizarem e criar animais e praticar a agricultura. Dado que a Revolução Neolítica, ou a Revolução Agropastoril, como coloca Laurant, criou uma barreira de "superioridade" entre homens e animais, sua tese é de que o xamanismo como religião tipicamente nômade, de caça e de igualdade espiritual entre homens e animais, necessitou de uma evolução(¹), ou mudança. Como pergunta, podemos formular o seguinte: Se a Religião cuida, neste momento, exclusivamente da atividade caçadora, qual o lugar que assume nas sociedades hidráulicas, pós Revolução Neolítica?

Nesta brevíssima dissertação, podemos identificar alguns itens da qual Laurant aponta como principais mudanças do Xamanismo, ainda na região da Sibéria, quanto á sedentarização de algumas sociedades. Primeiramente, o crescimento populacional muda drasticamente a sociedade, criando hierarquias entre as pessoas entre pequenos e grande criadores/agricultores. Igualmente, é criado um tipo de, segundo Laurant, estatuto da velhice, onde a idade é celebrada e idolatrizada, criando a noção de ancestralidade. Em outras palavras, o culto aos ancestrais, mais velhos e que já foram, é apontado como principal mudança das novas sociedades, espiritualmente falando. Com a mudança de tamanho dos grupos, estes clãs e linhagens acabam se definindo com referência á estes ancestrais, ou defuntos, como coloca o autor. Então, da ação de caçadores para pastores-coletores, aparecem mudanças como:

1) laço com as almas dos ancestrais antes da antiga relação de irmandade que humanos tinham com animais;
2) a representação do mundo passa de horizontal para vertical, ou seja, há a criação de uma hierarquia espiritual, envolvendo espíritos do mundo "palpável" da qual a perspectiva horizontal, igualitária do mundo passa para uma visão de mundo dominada por instâncias superiores;
3) surgimento de ritos essenciais, como a prece e o sacrifício;
4) mudança de noção de males como contrapartida (em uma linguagem simples, o famoso "toma lá, da cá") para males como sanções, ou castigo divino;
5) introdução de noções de graça por meio de sacrifícios, demonstrando uma nova desigualdade espiritual entre os seres;
6) um isolamento do xamanismo como ritual para curas individuais e adivinhação.

Laurant ainda cita por muitas vezes Roberte Hamayon, antropóloga francesa e atual diretora da École Pratique des Hautes Études. Hamayon cita em um de seus artigos uma sociedade de pastores-caçadores ehirit-bulagat, da qual acreditavam ser descendentes do "Senhor Touro" (Buha-Nojon), e que dele vinha seus rebanhos, pastagens, territórios e conhecimentos. Então, podemos identificar também a criação de um "ser supremo", alguma força ou alguma entidade criadora, que dele(a) provém tudo que há na terra e tudo que é conseguido pelos seus seguidores. Essa noção de "ser supremo" certamente deriva da forte hierarquização espiritual da qual tais sociedades estão passando. Por isso, a necessidade de venerar e implorar para estas já chamadas divindades.

Enxergamos também a importância dos sacrifícios nestas sociedades hidráulicas. Enquanto no xamanismo "tradicional" o xamã é visto como um intermediário nas barganhas entre o homem e os espíritos, conversando com eles e sabendo suas "artimanhas", no xamanismo "adaptado" não há necessidade de entender o que os espíritos dizem, e sim um "pedido de graça" é feito por meio de preces, onde o sacrifício entra como "pre-requisito" para a obtenção desta graça. Enquanto o caçador primeiro obtém e dá em seguida, o pastor primeiro oferece, tendo em vista conseguir depois, mas pegando aquilo que "produziu.

Ao contrário, a "punição" ou "castigo" é dada pelos ancestrais e espíritos superiores pelo "deixar de fazer". Suas sanções são aplicadas contra ações que transgridem uma ordem, hierarquia ou mandamento dado. Aqui percebemos a diferença com o xamanismo "tradicional", da qual punições são dadas por transgressões feitas, diferente do xamanismo "adaptado" que pune por rituais ou ações não feitas.

Por fim, o papel do xamã muda drasticamente durante a Revolução Neolítica. Ele acaba por perder suas funções coletivas quando a importância da caça diminui, e sobretudo quando a sociedade se hierarquiza colocando novas "divindades toda-poderosas" em seu lugar. Outro fator que auxilia na perda de importância do xamã é a criação de uma linguagem e escrita, da qual é possível a criação de uma liturgia utilizando-os. Portanto, o xamã acabou por recolher-se ao ambiente privado, praticando curas pessoais e bênçãos particulares e pontuais. Lambert ainda identifica, neste tipo de xamanismo "adaptado" a ampla presença de mulheres, provavelmente pela importância espiritual não estar mais no xamã. Não por "machismo" no sentido moderno, mas sim pela sociedade basicamente patriarcal e cultura centrada no criador e agricultor, funções desempenhadas primariamente pelo homem nestas sociedades. A presença das mulheres, ao contrário do que se imagina, está mais centrada no xamanismo branco, ou seja, de benfazejo, enquanto a presença masculina é mais comum no xamanismo negro, prejudicial e especialista em destruição e praga. Nota-se também que a separação entre xamanismos brancos e negros surgem bem posteriormente, com talvés a influência budista ou cristã.




(¹) Aqui, colocamos o termo "evolução" não na errônea intenção de "superioridade". Entendemos "evolução" como fatores que fazem com que determinado ser vivo, sociedade ou até mesmo utensílios sejam mais apropriados e/ou adaptados para novas condições de existência.

por Fernando Tetsuo Miyahira.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

"O Nascimento das Religiões" - ótima leitura para estudos introdutórios à Religião

O Professor em Sociologia da École des Hautes Études en Sciences Sociales, Yves Lambert, realmente surpreendeu com esta publicação: uma compilação de seus estudos no campo religioso, comentada e resumida. Utilizando-se da "história comparada das religiões", Lambert consegue dissertar, em uma linguagem simples porém acadêmica, sobre o surgimento da religiosidade em povos antepassados, que acabam por culminar no que hoje conhecemos como "religião".

Yves Lambert faleceu em 2006, aos 60 anos, foi professor na École des Hautes Études en Sciences Sociales, pesquisador do Groupe Société, Religions, Laïcités (CNRS-EPHE) e grande atuante no campo da sociologia na França.

Mesmo sendo uma obra extensa e pesada, sua linguagem, como dito anteriormente, é de fácio acesso mas não perdendo o foco acadêmico de suas pesquisas. "O Nascimento das Religiões: da pré-história ás religiões universalistas" é uma leitura importante e bem esclarecedora para quem está inciando seus estudos em Ciências da Religião, Teologia ou mesmo História. O que acabou mais chamando a atenção foi a parte inicial de sua obra. Lambert remonta aos estudos de Emilie Durkheim e James Frazer para fundar seus argumentos de como a religiosidade nasceu nos meios humanos. Voltando a atenção aos povos caçadores-coletores, Lambert esmiuça a palavra "xamã", que deu origem ás pessoas que incorporavam espíritos naturais a fim de ajudar seu povo na caça, principal atividade destes povos.

 Tomando como exemplo o povo evenque, um povo semi-nômade ainda existente na Sibéria, Lambert identifica os focos iniciais de religiosidade neles. Primeiro, o fato de serem caçadores-coletores, ou seja, surgirem antes da Revolução Neolítica, faz com que sua mentalidade tenha despertado um certo interesse em "moldar" o mundo aos desejos destes homens, uma vez que o desejo de interferirem de forma espiritual na caçada para que seja bem sucedida era existente. Apesar de haver indícios destes desejos anteriores ao povo evenque, e em lugares diferentes (como as pictografias em cavernas francesas da região sul do país), Lambert justifica sua escolha como sendo o primeiro povo que unificou e codificou, mesmo em linguagem verbal, suas características ritualísticas e espirituais na figura do Xamã. Em uma mistura de animismo e naturismo, Lambert volta sua atenção á interpretação de sonhos e contato dos evenques com elementos da natureza. 1) A presença da "alma" já havia sido investigada por Durkheim; por meio dos sonhos, este povo acreditava que seu "eu" interior saía do corpo hospedeiro á noite para vagar pela terra; 2) A observação da natureza, mais precisamente na figura dos animais, que eram além de sua caça também seus companheiros em terra, fez com que os evenques dotassem os animais dos mesmos princípios vitais dos homens. Neste ponto, segundo Lambert, havia uma "troca de princípios vitais" entre homem e animal, justificando seu consumo. O animal, quando caçado e morto, tinha sua alma dispersada na natureza para reencarnar, talvéz, em um corpo humano mais tarde, enquanto seu corpo era consumido junto com sua energia vital pelos homens. Quando estes morrem, voltam á natureza de duas formas: seu corpo volta á terra, que dá origem á vegetação, que por sua vez é consumida pelos animais, e sua alma reencarna em um corpo animal, criando assim um ciclo de reencarnação entre homem e animal. Lambert cita L. Delaby, e compara este ciclo com o fluxo do rio Lenissei, ao norte da Rússia), onde a nascente do rio é um lugar onde as almas, humanas e animais, esperam pare reencarnar, o seu curso é o mundo físico, onde há trocas vitais entre humanos e animais, e sua desembocadura seria o "mundo dos mortos", primeiro lugar onde as almas vão depois que morrem e esperar o momento em que, na forma de pássaros, voltem á nascente do rio para voltar ao mundo físico.

Um dos papéis do xamã pode ser localizado aqui, na figura de "guardião espiritual" das almas, cuidando delas para que possam reencarnar. Percebe-se aqui a grande importância do xamã, que está sempre em contato com o mundo espiritual desde sua "escolha": são os espíritos da natureza que o escolhem, sempre através dos sonhos. Para ser um xamã, é preciso ter "talento" para isso, pois os espíritos não escolhem qualquer pessoa. Após sofrer uma investidura do mundo espiritual (guiado e observado pelo xamã-mor do povo), sua própria comunidade o investe de poderes, acreditando nele e elaborando ritos de passagem para o novo xamã. Outra importância sua vem justamente do ofício caçador evenque: o xamã é o responsável pelos ritos pré-caçada. O xamã então "pede" aos espíritos que possam caçar e tenham sua bênção para matar animais. Este ponto é muito interessante, pois precisavam da autorização dos espíritos para matar os animais. É importante ressaltar que, no meio social dos evenques, nenhum animal pode ser morto sem o consentimento dos espíritos, uma vez que os animais dão sua energia vital para os homens e que os animais um dia já foram homens. Portanto, podemos entender a caçada realmente como uma necessidade, não um mero capricho. Caso os espíritos sejam desobecedidos ou desrespeitados, há o que Lambert chama de "alma fraca", ou seja, a doença, o desânimo, a depressão e até a morte. Qualquer morte "não natural" é vista como uma transgressão ao mundo espiritual, portanto, fora de seu curso natural.

Lambert continua seus estudos com a ideia de adaptação do xamanismo à sociedade agro-pastoril, fruto da Revolução Neolítica. Sabendo que o xamanismo é próprio de sociedades caçadoras-coletoras, o autor disserta sobre sua função nestas sociedades sedentárias, que produzem seu próprio alimento sem a necessidade primordial de caçar animais silvestres.

Veremos isto mais á frente, conforme minha leitura for progredindo. Por enquanto, esta é a bibliografia da leitura:

LAMBERT, Yves. "O Nascimento das Religiões". São Paulo - SP: Ed. Loyola, 2011.

por Fernando Tetsuo Miyahira.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

De volta á ativa!

Boa noite, caros leitores! Após (quase) um ano praticamente "abandonado", o blog Novum Religionis voltará á ativa neste mês. O motivo da falta de postagens se deve ao fato de intensa falta de disponibilidade, por causa de estudos, trabalho, etc. Com problemas e pendências resolvidas, voltarão as postagens de micro-artigos, artigos, discussões e comentários sobre eventos envolvendo religião e religiosidade, sempre vistas através das lentes das Ciências Humanas. Agradeço á quem nos tem ajudado e apoiado, com ou sem postagens.

Boas leituras!