quinta-feira, 17 de maio de 2012

"O Nascimento das Religiões" - ótima leitura para estudos introdutórios à Religião

O Professor em Sociologia da École des Hautes Études en Sciences Sociales, Yves Lambert, realmente surpreendeu com esta publicação: uma compilação de seus estudos no campo religioso, comentada e resumida. Utilizando-se da "história comparada das religiões", Lambert consegue dissertar, em uma linguagem simples porém acadêmica, sobre o surgimento da religiosidade em povos antepassados, que acabam por culminar no que hoje conhecemos como "religião".

Yves Lambert faleceu em 2006, aos 60 anos, foi professor na École des Hautes Études en Sciences Sociales, pesquisador do Groupe Société, Religions, Laïcités (CNRS-EPHE) e grande atuante no campo da sociologia na França.

Mesmo sendo uma obra extensa e pesada, sua linguagem, como dito anteriormente, é de fácio acesso mas não perdendo o foco acadêmico de suas pesquisas. "O Nascimento das Religiões: da pré-história ás religiões universalistas" é uma leitura importante e bem esclarecedora para quem está inciando seus estudos em Ciências da Religião, Teologia ou mesmo História. O que acabou mais chamando a atenção foi a parte inicial de sua obra. Lambert remonta aos estudos de Emilie Durkheim e James Frazer para fundar seus argumentos de como a religiosidade nasceu nos meios humanos. Voltando a atenção aos povos caçadores-coletores, Lambert esmiuça a palavra "xamã", que deu origem ás pessoas que incorporavam espíritos naturais a fim de ajudar seu povo na caça, principal atividade destes povos.

 Tomando como exemplo o povo evenque, um povo semi-nômade ainda existente na Sibéria, Lambert identifica os focos iniciais de religiosidade neles. Primeiro, o fato de serem caçadores-coletores, ou seja, surgirem antes da Revolução Neolítica, faz com que sua mentalidade tenha despertado um certo interesse em "moldar" o mundo aos desejos destes homens, uma vez que o desejo de interferirem de forma espiritual na caçada para que seja bem sucedida era existente. Apesar de haver indícios destes desejos anteriores ao povo evenque, e em lugares diferentes (como as pictografias em cavernas francesas da região sul do país), Lambert justifica sua escolha como sendo o primeiro povo que unificou e codificou, mesmo em linguagem verbal, suas características ritualísticas e espirituais na figura do Xamã. Em uma mistura de animismo e naturismo, Lambert volta sua atenção á interpretação de sonhos e contato dos evenques com elementos da natureza. 1) A presença da "alma" já havia sido investigada por Durkheim; por meio dos sonhos, este povo acreditava que seu "eu" interior saía do corpo hospedeiro á noite para vagar pela terra; 2) A observação da natureza, mais precisamente na figura dos animais, que eram além de sua caça também seus companheiros em terra, fez com que os evenques dotassem os animais dos mesmos princípios vitais dos homens. Neste ponto, segundo Lambert, havia uma "troca de princípios vitais" entre homem e animal, justificando seu consumo. O animal, quando caçado e morto, tinha sua alma dispersada na natureza para reencarnar, talvéz, em um corpo humano mais tarde, enquanto seu corpo era consumido junto com sua energia vital pelos homens. Quando estes morrem, voltam á natureza de duas formas: seu corpo volta á terra, que dá origem á vegetação, que por sua vez é consumida pelos animais, e sua alma reencarna em um corpo animal, criando assim um ciclo de reencarnação entre homem e animal. Lambert cita L. Delaby, e compara este ciclo com o fluxo do rio Lenissei, ao norte da Rússia), onde a nascente do rio é um lugar onde as almas, humanas e animais, esperam pare reencarnar, o seu curso é o mundo físico, onde há trocas vitais entre humanos e animais, e sua desembocadura seria o "mundo dos mortos", primeiro lugar onde as almas vão depois que morrem e esperar o momento em que, na forma de pássaros, voltem á nascente do rio para voltar ao mundo físico.

Um dos papéis do xamã pode ser localizado aqui, na figura de "guardião espiritual" das almas, cuidando delas para que possam reencarnar. Percebe-se aqui a grande importância do xamã, que está sempre em contato com o mundo espiritual desde sua "escolha": são os espíritos da natureza que o escolhem, sempre através dos sonhos. Para ser um xamã, é preciso ter "talento" para isso, pois os espíritos não escolhem qualquer pessoa. Após sofrer uma investidura do mundo espiritual (guiado e observado pelo xamã-mor do povo), sua própria comunidade o investe de poderes, acreditando nele e elaborando ritos de passagem para o novo xamã. Outra importância sua vem justamente do ofício caçador evenque: o xamã é o responsável pelos ritos pré-caçada. O xamã então "pede" aos espíritos que possam caçar e tenham sua bênção para matar animais. Este ponto é muito interessante, pois precisavam da autorização dos espíritos para matar os animais. É importante ressaltar que, no meio social dos evenques, nenhum animal pode ser morto sem o consentimento dos espíritos, uma vez que os animais dão sua energia vital para os homens e que os animais um dia já foram homens. Portanto, podemos entender a caçada realmente como uma necessidade, não um mero capricho. Caso os espíritos sejam desobecedidos ou desrespeitados, há o que Lambert chama de "alma fraca", ou seja, a doença, o desânimo, a depressão e até a morte. Qualquer morte "não natural" é vista como uma transgressão ao mundo espiritual, portanto, fora de seu curso natural.

Lambert continua seus estudos com a ideia de adaptação do xamanismo à sociedade agro-pastoril, fruto da Revolução Neolítica. Sabendo que o xamanismo é próprio de sociedades caçadoras-coletoras, o autor disserta sobre sua função nestas sociedades sedentárias, que produzem seu próprio alimento sem a necessidade primordial de caçar animais silvestres.

Veremos isto mais á frente, conforme minha leitura for progredindo. Por enquanto, esta é a bibliografia da leitura:

LAMBERT, Yves. "O Nascimento das Religiões". São Paulo - SP: Ed. Loyola, 2011.

por Fernando Tetsuo Miyahira.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

De volta á ativa!

Boa noite, caros leitores! Após (quase) um ano praticamente "abandonado", o blog Novum Religionis voltará á ativa neste mês. O motivo da falta de postagens se deve ao fato de intensa falta de disponibilidade, por causa de estudos, trabalho, etc. Com problemas e pendências resolvidas, voltarão as postagens de micro-artigos, artigos, discussões e comentários sobre eventos envolvendo religião e religiosidade, sempre vistas através das lentes das Ciências Humanas. Agradeço á quem nos tem ajudado e apoiado, com ou sem postagens.

Boas leituras!